Segunda-feira, 25 de Agosto de 2008

SOBRE A EDUCAÇÃO: SÉC. XXI

 ENSINO FUNDAMENTAL

«
Olhar de um Físico
por Rui Namorado Rosa
31
Flexibilização do trabalho, flexibilização do ensino
(…)
A sociedade portuguesa
vê-se ameaçada em
direitos e garantias adquiridos
e vê-se feroz e impiedosamente
explorada
por iniquidades sociais e económicas.
Contrariando os esforços manipuladores do grande capital através dos governos submissos e da comunicação social ao seu serviço, os professores, os estudantes, as comunidades educativas em geral, têm a percepção ou mesmo a clara compreensão do actual processo em marcha contra o bem comum que é a Escola e o Ensino Público. Por isso resistem e vão à luta. É uma luta de resistência e prolongada, cuja origem e progressão e cujos objectivos importa reflectir.
Aprendizagens e formação ao longo da vida com a "flexibilização" à vista
A "flexibilização" é um dos conceitos chaves do discurso neoliberal. Tem como alvo a maioria da população menos qualificada, que ela pretende aceite como natural e boa a precaridade dum emprego incerto e indefinido. A "aprendizagem ao longo da vida" é um outro conceito chave, com aquele intimamente relacionado. Tem como alvo a mesma população, agora para a manter como um enorme exército em condições de vender a todo o momento o seu trabalho, submisso e aplacado. Assim não surpreende a frequência com que documentação e acções relacionadas com a aprendizagem ao longo da vida se têm sucedido nos últimos anos, na procura ainda de uma formulação ajustada e mais convincente: formação contínua, ou permanente, ou ao longo da vida e, agora, aprendizagem ao longo da vida, insinuando que é ao trabalhador que compete saber actualizar-se para que adquira ou mereça "empregabilidade"
(…)
Os programas de ensino secundário, sobretudo preenchidos de saberes e símbolos culturais e destinados à legitimação das relações sociais pré-existente, sobreviveram a época de massificação do ensino sem descaracterização profunda, ficando progressivamente inadaptados à elevação do nível de formação profissional de massas.
(…)
O resultado final será uma económica (para o capital) selecção de competências e a sua flexível mobilidade, produzidas por via de puro darwinismo social.
O capitalismo é desumanizante.
Como é que isto surgiu e como será? Foi em 1995 que a European Round Table (confederação de grandes empresários) formalizou a sua proposta de "reforma educativa" e afirmou então "Os métodos e instrumentos de educação deveriam ser modernizados, particularmente para encorajar a auto-aprendizagem (…) na escola e em casa (…) cada aluno deveria a prazo dispor do seu próprio computador." Esta proposta encontraria então condições favoráveis para avançar.
(…)
Oportunidades contraditórias do Ensino à distância e "online"
A Internet parece ser a tecnologia da informação e comunicação - TIC - mais promissora para concretizar rápida e amplamente certos objectivos já identificados: o ensino à distância, a aprendizagem ao longo da vida e a comercialização dos serviços de ensino, em competição com o processo geral da Educação.
Essa uma boa
()
razão para
tanto se focar a atenção
sobre esta TIC em particular,
remetendo para
um plano mais recuado
a importância de outras TIC,
omnipresentes e não menos poderosas,
como as telecomunicações móveis,
a observação e a navegação via satélite,
a automatização
e
robotização
crescentes das linhas de fabrico, etc.,
que nos libertam e nos vigiam,
nos empregam e desempregam, etc.
(…)
O ensino "online" é um instrumento muito versátil e poderoso. Importa descodificar e analisar a diversidade de motivações que animam os protagonistas em presença, a começar pelas corporações transnacionais -CTN - constituídas e em processo de constituição nos domínios das telecomunicações, da indústria multimédia, do comércio electrónico ("eCommerce") e do ensino electrónico ("eLearning") e pelos governos e instituições internacionais; cabe também aos educadores e investigadores, embora em contra-corrente, extrair as virtualidades da Internet para efeitos pedagógicos construtivos. [Chris Werry, The Work of Education in the Age of E-College, First Monday, volume 6, number 5, May 2001, www.firstmonday.dk/issues/issue6_5/werry/].
No ensino privado empresarial
, como a experiência noutros sectores empresariais tem mostrado, os grupos mais poderosos (incluindo os mais precoces) seguem estratégias agressivas para conquistarem posições monopolistas, ressarcindo-se amplamente dos seus encargos passados com grossos proveitos futuros.
Pelo caminho fica a Educação ela própria
, pois o que se oferece e é adquirido são "competências" específicas e padronizadas, centradas numa relação homem-máquina (uma dada máquina), cultural e socialmente constrangedora. Inovações tecnológicas, potencialmente libertadoras de tempo de trabalho necessário, conduzem pelo contrário, na economia de mercado capitalista, ao empobrecimento pessoal e social, à desumanização do trabalhador. E a uma subtil mas poderosa dependência funcional e económica do indivíduo face à máquina, cuja actualidade ou obsolescência é manipulada pelo grande capital, como os demais bens de consumo. A escolha que se nos quer oferecer é entre a "infor-exclusão", a que a maioria não escapa, e a "infor-dependência", em que os demais ficam aprisionados.
(…)
Como será esse "homem novo" que resultará dessa modalidade de Educação em que a socialização (?) é mediada pela máquina?Os Antropólogos dirão.
"Desregulamentação" a caminho da "economia de mercado"
(…)
"…(o benefício do ensino em alternância) é aprender a tornar-se parte de uma equipa de trabalho, a aceitar receber ordens e a trabalhar com os outros. Também compreender melhor o ritmo do trabalho e a estar apto a corresponder a exigências diferentes nas etapas sucessivas de uma carreira"
(…)
; outras: "…o sistema escolar deve esforçar-se por reduzir o seu tempo de resposta fazendo uso de fórmulas mais flexíveis que aquelas da função pública, a fim de criar ou encerrar secções técnicas ou profissionais, utilizar pessoal competente e dispor dos equipamentos necessários"; "As múltiplas evoluções tornadas necessárias pelas transformações económicas e tecnológicas já não permitem aos sistemas escolares nem aos poderes públicos assumirem sozinhos a formação inicial e a formação contínua da mão-de-obra
(…)
 (é necessário) encontrar uma partilha de responsabilidades que, de acordo com as particularidades dos países, garantam ao mesmo tempo a qualidade e a flexibilidade dos ensinos e das formações"
(…)
 "…(quanto à escola pública, esta deverá) assegurar o acesso à aprendizagem àqueles que nunca constituirão um mercado rentável e cuja exclusão da sociedade em geral se acentuará à medida que outros continuarão a progredir"
(…)
 e ainda "…admite-se que a aprendizagem se desenrole em contextos múltiplos, formais e informais
(…)
 a globalização económica, política e cultural torna obsoleta a instituição implantada localmente e ancorada numa cultura determinada sob o nome de Escola e ao mesmo tempo que ela, o docente"
(…)
Das sucessivas recomendações resulta uma debilitação da centralidade da Educação como objectivo da Escola para a colocar a reboque de uma utilidade estritamente empresarial. Ao mesmo tempo, observa-se na União Europeia em geral a tendência para a descentralização da administração da rede escolar, dos governos centrais para níveis intermédios, até à maior autonomia escolar (importa ver em quê), mas invocando a sua acrescida responsabilização (importa ver em quê também); assiste-se igualmente ao questionamento da capacidade do sistema escolar e das autoridades públicas para assegurarem os seus objectivos, a par da exaltação dos méritos das aprendizagens informais e em alternância realizadas "fora de portas". Por um lado dir-se-ia que se confere maior centralidade às escolas, por outro verifica-se que se lha retira; o resultado final é uma séria ameaça à credibilidade da Escola pública no presente contexto e uma generosa facilitação da privatização do ensino; as instituições de ensino privado comercial estão atentas e agradecem.
(…)
A Educação como mercadoria
"Um acordo global está a ser negociado para permitir às empresas transnacionais apoderarem-se dos serviços públicos de todo o mundo - independentemente da vontade dos povos. Se entrar em vigor, isso significará
a extinção do sector público
" [Maude Barlow, GATS: a última fronteira da globalização, 2002, http://resistir.info/ambiente/barlow_gats.html]. As despesas anuais com Educação somam perto de US$ 2 triliões (milhões de milhões) a nível mundial [Cynthia Guttman, Éducation: un marché de 2 000 milliards de dollars, Courier de l'UNESCO, Novembre 2000, www.unesco.org/courier/2000_11/fr/doss0.htm], ou seja, um montante comparável com o de transacções de combustíveis fósseis e duplo do mercado automóvel. É obviamente um alvo muito apetecível para o capital naquilo que tiver de rentável no seu ponto de vista.
(…)
A caminho da privatização e comercialização global da Educação
(…)
"…Existe a possibilidade de estas reformas comprometerem o tradicional sistema público democrático operado por entidades responsabilizadas. Por outro lado, muitos argumentariam que a liberalização comercial cria um sistema educativo de natureza empresarial e dependente do comportamento do mercado. Contudo, ao mesmo tempo, a verdade é que os serviços educativos já são oferecidos em base comercial e existem operadores europeus interessados em promoverem serviços educacionais no estrangeiro…"
(…)
Entretanto, com os patrocínios do Banco Mundial, da OCDE, da UE e outros de menor peso, numerosas agremiações patronais e profissionais lançaram-se numa intensa campanha de simpósios, congressos, feiras, etc. para promoção da nova filosofia das formações e aprendizagens, dos seus inovadores produtos e metodologias bem como, naturalmente, dos próprios agentes de tais mudanças, que assim procuram publicitação, parcerias e futuras oportunidades de negócios. Esta actividade é frenética por toda a Europa.
(…)
É tempo de tomar partido.
O desenrolar deste confronto ideológico e social não está determinado. A luta é difícil para ambos os lados. Sobretudo vital para o lado do capital, não só mas também no domínio da Educação, pois que é a sua sobrevivência que está em causa. "A reforma mais frequentemente necessária e a mais perigosa é a das empresas públicas, seja em caso de sua reorganização seja da sua privatização. Esta reforma é muito difícil porque os assalariados deste sector estão frequentemente bem organizados e controlam domínios estratégicos. Vão bater-se com todos os meios possíveis

(…)

Quanto mais um país tenha desenvolvido um grande sector público, mais esta reforma será difícil de concretizar" [Morrisson Christian, La Faisabilité politique de l'ajustement, Cahier de politique économique n°13, OCDE 1996, www.oecd.org/dataoecd/24/22/1919060.pdf]. Contrariando os esforços manipuladores do grande capital através dos governos submissos e da comunicação social ao seu serviço, os professores, os estudantes, as comunidades educativas em geral, têm a percepção ou mesmo a compreensão do processo em marcha. Por isso resistem e vão à luta.
»

In: http://www.janelanaweb.com/digitais/rui_rosa31.html

publicado por Alex.S. às 11:27
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